França, início dos anos 70. Para a menina Anna, de nove anos, homens barbudos e de expressão enérgica são comunistas que querem a guerra nuclear. Ativos militantes de esquerda, seus pais apelidaram a única conservadora da família de "pequena múmia", em referência aos adversários de Salvador Allende, então presidente do Chile, cujas reformas o casal apoia a distância. As conexões entre a situação política do planeta e seus reflexos no cotidiano embaralham a percepção de Anna (Nina Kervel-Bey) e de seu irmão caçula (Benjamin Feuillet) em A Culpa é de Fidel! (França, 2007, 95 min, disponível somente para locação). Espirituosa estreia na ficção da documentarista Julie Gravas, filha do diretor Costa-Gravas (de quem foi assistente no contravertido Amém, que denuncia aliança entre o Vaticano e nazistas). Uma das principais referências do cinema político contemporâneo, diretor também de filmes como Z (1969), A Confissão (1970) e Estado de sítio (1972), Costa-Gravas explorou o golpe militar que derrubou Allende em Desaparecido, um grande mistério (1982). O tom adotado por Julie a aproxima mais, no entanto, de outra representação do mesmo período, o longa-metragem chileno Machucha (2004), de Andrés Wood, em que o conturbado cenário político do período também é visto da perspectiva infantil. Em A Culpa é do Fidel!, pai (Stefano Accorsi, de Capitães de abril, que reconstitui a queda da ditadura de Antonio Salazar em Portugal) e mãe (Julie Depardieu, filha do também ator Gerard Depardieu) vivem diante dos filhos os dilemas de quem se preocupava, naquele momento, em intervir de alguma forma na sociedade. Baseada em romance de Domitilla Calamai, a história contada por Julie sugere que esse espírito de solidariedade e de mobilização, talvez, seja o maior legado que se possa transmitir.
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